04 February 1998

Busto Eterniza Figura de Aristides de Sousa Mendes



A Câmara Municipal de Carregal do Sal e a Direcção Municipal de Monumentos Nacionais vão unir esforços no sentido de prestar a homenagem que falta a Aristides de Sousa Mendes - o diplomata português que salvou dezenas de milhar de judeus do holocausto nazi durante a II Guerra Mundial -, através da colocação de um busto do diplomata em Cabanas de Viritato, na sua terra natal.
Referindo-se ao "Oscar Schindler português", o presidente da autarquia, Atílio dos Santos Nunes, refere que " é uma pena que este ilustre filho de Cabanas já tenha sido homenageado em França, Israel e Estados Unidos e não na sua terra natal ".
Decidido que está o destino a dar ao degradado palacete de Sousa Mendes, em Cabanas de Viriato ( onde ainda escondeu e ajudou algumas dezenas de judeus ) e que vai ser transformado num moderno hotel, Atílio dos Santos Nunes refere que a excelente colaboração e receptividade dada pela Direcção Geral dos Monumentos Nacionais à ideia de colocar um busto do diplomata "irá compensar as décadas de esquecimento a que Aristides de Sousa Mendes foi votado, repondo uma justiça que tarda".
Aristides de Sousa Mendes nasceu a 19 de Julho de 1885 em Cabanas de Viriato, no seio de uma família de aristocratas "marranos", isto é, "cristãos novos", tendo-se licenciado em Direito em 1910 na Universidade de Coimbra, exercendo, a partir daí, a carreira de professor até 1938, ano em que seria nomeado cônsul em Bordéus, funções que manteve até Julho de 1940.
Um ano depois de ter chegado a Bordéus começava a II Guerra Mundial com a invasão alemã da Polónia, ao que se seguiriam os Países Baixos e a França, provocando uma autêntica avalhancha de europeus ( especialmente judeus ) que procuravam escapar ao jugo nazi, pretendendo a todo o custo um refúgio seguro nos países "neutrais", entre eles Portugal, o que se encontrava mais afastado da Alemanha.
Logo após a invasão da Polónia, Aristides de Sousa Mendes pediu autorização a Lisboa para conceder vistos a quem procurasse refúgio em Portugal e, como resposta, recebeu a célebre Circular nº 14 do Ministério dos Negócios Estrangeiros, determinando que "as delegações diplomáticas portuguesas só podem emitir vistos a quem for portador de uma passagem válida para navios a sair de Lisboa, não devendo, em caso algum, ser emitidos vistos a russos, checos, húngaros e, em nenhuma circunstância, a judeus".
Vistos em papel de embrulho
Após a invasão de França ( Maio de 1940 ), Aristides de Sousa Mendes, ignorando por completo a Circular nº 14, começou a emitir vistos aos milhares de refugiados que acampavam junto ao Consulado Português de Bordéus. Em apenas três dias ( 16 a 18 de Junho de 1940 ) e auxiliado pelos filhos, o diplomata emitiu mais de 30 mil "vistos de trânsito", 12 mil dos quais destinados a judeus.
Ao cabo de alguns dias de trabalho árduo e quando os impressos esgotaram, o cônsul de Portugal começou a emitir os vistos em simples papel de carta e, mais tarde, em qualquer pedaço de papel com a dimensão suficiente para levar o carimbo do Consulado e a assinatura de Sousa Mendes. O diplomata chegou mesmo a carimbar e assinar pequenos pedaços de papel pardo de embrulho, cortados à pressa.
Chegado a Lisboa em Junho de 1940 ( por imposição de Salazar ), Aristides de Sousa Mendes foi imediatamente destituído do Corpo Diplomático e proibído de exercer a advocacia. Os benefícios e reforma a que tinha direito foram-lhe retirados. Para sobreviver foi obrigado a vender todas as suas propriedades e bens, acabando por morrer na miséria em 3 de Abril de 1954.
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Correio da Manhã